quarta-feira, 8 de outubro de 2008



Comecei o dia levando na brincadeira meu trabalho de fotojornalismo. Estudamos, lemos, debatemos, assistimos e ouvimos sobre Sebastião Salgado durante várias aulas. Hoje era o dia de fazermos uma espécie de releitura da obra dele. O que mais me fascina e indigna é a minha própria perplexidade diante das fotos dele. Não importa se são crianças, velhos, se falamos em Êxodo ou Terras, ou no Espectro da Esperança. Minha cara no chão é a mesma.
Já chorei, já fechei o livro, já tive ânsia. Mas nem de longe olhando as fotos senti o que vivi quando fui fotografar. Para as primeiras fotos escolhi uma “tribo indígena” que se situa atrás da rodoviária aqui em Passo Fundo, a “tribo” é composta por três famílias, alguns agregados que nada tem de indígena. A única semelhança é a situação de marginalizado que vivem. Sim. Não fotografei oca, pajé, nem uma cultura exótica. Fotografei mais uma cena de pobreza. Brancos, negros, índios, pobres. Num lugar sem condições de receber individuo algum e oferecer se não conforto, dignidade. Não é conversa de menininha que teve tudo e nunca viu a vida lá fora. É papo de quem não consegue aceitar viver numa sociedade tão desproporcional. Eu estava ali de jeans, tênis e blusa. Eles estavam de pés de calço, sem banheiro, comida, no meio da imundice humana que criamos. Eu tinha em mãos um equipamento que vale mais dinheiro do que eles jamais terão na vida. Ia fotografar a vida deles. Eles eram meu objeto inanimado. Instinto de minha curiosidade sagaz. Eu me senti desumana. Queria pedir-lhes desculpas por estar ali, por ser o outro lado, por não poder fazer nada. Eles me contaram muito, pediram ajuda, socorro, querem ser vistos. Querem dizer ao mundo que existem e são tão importantes quanto eu e você que me lê. Eu não podia fazer absolutamente nada. Além de me resguardar na minha vergonha. Eles me presentearam com olhares de esperança, eu que esperava encontrar sofreguidão. Me ofereceram sorrisos, enquanto pensava encontrar desespero. Ganhei uma pulseira de pano, o ganha pão de uma senhora, que ao me ofertar me disse: “lembre de mim, porque eu rezarei por ti para que venças na vida”. Ela. Ela acredita em mim, como nem eu mesma sou capaz diariamente.
Tenho tido tantas lições, não sei se foi porque de repente cresci. Não sei se porque estou crescendo. Apenas sei que a vida tem sido extremamente generosa comigo. Escrever, descrever sobre essa experiência é uma maneira singela de agradecer pela oportunidade de ver a vida assim mesmo em p&b, como tanto gosto. De ter certeza que fiz a escolha certa, usar o jornalismo, a poesia, a paixão pela fotografia (que cresce) para desvendar o submundo que não nos sujeitamos a enxergar todo dia.


3 comentários:

Unknown disse...

olhaaaaaaa... concordo com tudo! exatamente com cada parte não só das palavras mais da foto também. Acho que para isso nascemos e para isso fomos criadas. Hoje estou lendo um livro As boas mulheres da China, que me mostra como o papel da "jornalista" pode influenciar muito, mesmo que não se possa mudar totalmente uma sociedade. Acho tanto vc quanto sua máquina fotográfica podem ter voz. E fico feliz pela bela foto!
bjossssss
tamo

Sidnei Almeida disse...

Bom texto.
A realidade que muitos cidadãos de classe média não veêm, pois tiveram tudo que sempre desejaram...
Enquant essas pessoas necessitadas sofrem, "nós" desfrutamos de uma vida boa, que nem é valorizada.
Estamos ai para isso.
Futuros jornalistas, formadores de um país mais igualitário e desenvolvido.
Espero que coloque em prática seus pensamentos.
Acredito que mudará muita coisa se assim quiseres.
Bjs, continue com esse pensamento humano e humilde.
Terás sucesso.

Anônimo disse...

Oi Schali! Teu texto-desabafo está belíssimo, tenha certeza que as lembranças desse dia que ficaram no teu coração te tornam cada dia uma pessoa melhor. O blog está transbordando uma nova Schaline, que eu não conhecia, e que admiro bastante. Sucesso!