domingo, 6 de março de 2016

O que fica quando você vai

A casa parece vazia ao mesmo passo que está do jeito que eu sempre quis. Não tem xícaras espalhadas, nem calçados, nem o açúcar esquecido em cima da pia.
A cama está grande, mas não sinto mais a falta do abraço que me negavas toda madrugada. Sua cadeira permanece abandonada no canto da sala. Não preciso entrar em acordo para que as crianças durmam "só essa noite" no nosso quarto. Meu quarto agora.
Sobra espaço no guarda-roupa e mesmo com outras prateleiras abarrotadas não tive ânimo de ocupar teu espaço.
O fim de semana parece longo, fica sem sentido e me sinto só ao mesmo passo que me sinto bem.
Já acertei a rotina sem você, na verdade você só estava aqui. Não participava.
O sábado a noite ficou estranho, assisti nossos programas preferidos sozinha e faltou teus comentários, você para partilhar a risada.
Tuas fotos pela casa permanecem e cada vez que bato os olhos nelas sinto uma pontada de dor. Aonde foi parar todo aquele amor que já sentimos?
Faltam teus abraços. Ou apenas faltam abraços? Falta tua presença ou apenas falta uma presença qualquer?
Vai existir outro alguém a fincar raízes? Vai existir mais alguém a quem eu possa mostrar como sou sem medo?
Não sei se falta você ou falta aprender a conviver comigo mesma depois de tanto tempo sendo tudo para você.
Desaprendi a viver sozinha. Mesmo estando acompanhada agora. A rotina não pesa, o cuidado sozinho às crianças também não, porque tudo isso já era assim mesmo quando estavas aqui.
Pesa a falta de atenção, a falta de carinho, a falta de amor. E essa falta está presente há tanto tempo que parece sufocar agora. Pesa o medo de me entregar as minhas escolhas. Pesa o receio de jogar fora tudo que construí ao seu lado. Pesa o medo. Pesa o medo. Pesa ao mesmo passo que me jogo na contra mão e quero tudo isso. Podíamos ter vivido um grande amor. Talvez vivemos. E acabou. Se é que amor acaba.

sábado, 27 de fevereiro de 2016

Gravura



Não foram muitas as vezes em que tive a oportunidade de caminhar pela Beira Rio, mas sempre que penso em Itajaí me vêm a mente a mesma cena. Calçada da Beira Rio, o som da água, o vento e os barquinhos na encosta flutuando com o balanço da maré. O vento como a música que embala o barco, o par perfeito para o mar.
Meio dia, minutos vagos e o sol a pino refletido na água que balança os barquinhos da encosta. Final de tarde, pôr do sol e os raios refletidos na água, os mesmos barcos, o mesmo balanço. O negro da noite interrompido pelos raios do luar e mais uma vez todos os barquinhos em sintonia navegando ancorados no mesmo mar.
E para cada hora, uma música. Final do dia, os barquinhos parecem dançar Temporada das Flores, de Leoni, ao anoitecer os vejo sibilar Noites com Sol ao som de Flávio Venturini. No almoço não precisa de canção. As gaivotas planando na água dão o som necessário à paisagem.
Poderia escrever sobre os cheiros do Mercado Público, sobre o movimento da Hercílio Luz ou sobre todas as luzes da Matriz. Sobre o silêncio da Praça da Igrejinha em que um dia sonhei casar. Mas, tudo é pouco, porque o quadro que minha memória guarda para a palavra Itajaí são os barquinhos navegando na Beira Rio.
Dependendo do dia eu poderia cantarolar até Farol dos Afogados, se estivesse triste. Mas, no fundo só penso em paixão quando estou ali. Quando por lá minha imaginação passeia parece que todos os dias vagam naquelas calçadas. Parece que moro nesta cidade todas as horas. Parece que anseio em estar aqui e por isso valem todos os sacrifícios.
Ali no leste o sol nasce todas as manhãs e ilumina meus barquinhos. Cada barco um sonho, uma sensação, um friozinho na barriga. Cada balanço, um passo. E toda a cidade cabe nesta gravura.


segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Sobressaltos

Quero a minha volta pessoas que somem, multipliquem e se dividam. Não quero mais quem me faz mal, quem me obriga a ficar distante do que gosto e a quem não consigo me entregar por inteiro.
Quero alguém que tenha olhos mais bondosos para o que há em volta. Alguém que enxergue o que há em volta, além de si mesmo.
Alguém que se sacrifique na mesma medida, mas não dispute os resultados, e sim se felicite por ter conseguido ou por me ajudar a conseguir.
Quero alguém que não me deixe com medos e que não use meus fantasmas para me diminuir. Quero alguém que se permita a dividir os seus fantasmas. Que acredite em mim e em quem eu possa acreditar.
Não gosto, mas quero um pouco de sobressaltos. Paixão. Quero um amor que não se acomode, que não arranje tantas desculpas e nem tenha preguiça de amar.
Eu quero viver um pouquinho mais. Quero alguém que me faça sentir mulher, antes de mãe, esposa, amiga.
Quero alguém que eu sinta orgulho de dizer "é meu". Estamos juntos. E que de fato eu sinta que estamos juntos para o que der e vier.
Quero dividir fantasias sem receios, sem ser criticada. Quero que se juntos tudo seja permitido para sermos felizes. Não quero me sentir só estando presa. Não quero estando junto me sentir só. E não quero prender.
Quero ter certeza que somos um para o outro. Quero ver mais amor nas atitudes do outro, mesmo que nunca saiam de sua boca as três palavrinhas mágicas "eu amo você".
Quero que fiques porque não quero mais me sentir só. Quero calmaria no sobressalto. Quero que os anos passem e nem o tesão, nem o respeito diminuam.
Quero sentir mais que gratidão. Quero sobressalto.
Todo mundo devia querer.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

O que não ousamos dizer



Já não escrevo. Escrever é verbalizar sentimentos e opiniões que nem sempre pedem vida. Embora fiquem pulsando dentro da gente.
São como formiguinhas na mente que ficam brincando com a nossa paz para adoçar a rotina. Ou nos sugá-los dela.
Mas, se a gente escreve corre o risco de ecoar aos montes aquilo que só nos faz bem no campo da imaginação.
Então a gente brinca que escreve para fingir para as formiguinhas que elas conseguiram seu propósito. E respira aliviado por saber que não cedeu a vontade do poeta adormecido que vive a espreita de nossas escolhas.
Ufa. Conseguimos. Ludibriamos a nós mesmos. Enganados e convencidos de que não foi dito mais que deveria. E o que importa segue velado.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

O que já não somos


Será que já está tudo tão errado que qualquer "fio de cabelo" é o fim?
Será que só podemos nos dar bem da meia-noite às oito e meia da manhã?

...

Será que já nos importamos tão pouco um com o outro que nada faz sentido?
Que não dá pra ceder nem por um instante?

Onde nos perdemos tanto?
O que fizemos de errado para apagar até os momentos felizes?

...


Afinal, quando foi que deixamos de sonhar juntos?